Alvo das investigações, a administração do Instituto Heitor Coelho (IHC) nega qualquer irregularidade

A Prefeitura de Juazeiro do Norte abriu investigação contra o Instituto Heitor Coelho (IHC) por suspeita de pagamento de propina a servidores públicos e irregularidades em contratos da saúde. A apuração foi instaurada pela Controladoria Municipal e publicada no Diário Oficial no último dia 12 de setembro. O IHC nega as acusações.
Segundo a gestão do prefeito Glêdson Bezerra (Podemos), apurações preliminares identificaram indícios de pagamentos indevidos, fraudes contratuais e prejuízo estimado em R$ 176,6 mil aos cofres públicos.
O relatório da Controladoria identificou “indícios consistentes de irregularidades” como: cobrança duplicada de serviços; inclusão de procedimentos não contratualizados; valores incompatíveis com o tempo de terapia e falta de comprovação de execução. A recomendação foi pela abertura de Processo Administrativo de Responsabilização (PAR), que terá prazo de 180 dias, prorrogável pelo mesmo período, para aprofundar a apuração.

Contratos sob suspeita
O Instituto mantém relação com o Município desde 2022 para a prestação de serviço de habilitação e reabilitação de pessoas com deficiência intelectual e múltipla. Dois contratos são alvos de suspeita, um estabelecido em 2024 e outro firmado no ano passado. O suposto esquema buscava elevar o teto contratual, ou seja, o limite máximo de acréscimos permitidos na prestação dos serviços, abrindo caminho para superfaturamento e desvio de recursos.
As denúncias contra o IHC foram registradas em junho deste ano, após queixas anônimas diretamente ao Gabinete do prefeito Glêdson Bezerra. No dia 12 daquele mês, dois servidores da Secretaria Municipal de Saúde (Sesau) foram flagrados pela Guarda Civil Municipal recebendo R$ 20 mil de uma dirigente do Instituto.

Segundo a investigação interna da Prefeitura, o montante seria parte de uma propina de R$ 60 mil paga mensalmente pelo Instituto aos servidores públicos. Os funcionários foram afastados e o contrato com o IHC, suspenso. O caso também é investigado pela Polícia Civil (PCCE).
“O que efetivamente ocorreu foi a abordagem de um repasse de dinheiro em espécie, em via pública, entre a presidente do instituto e dois servidores municipais que, em razão das funções que exercem, não poderiam manter qualquer relação financeira com a entidade. A atuação da Guarda Civil Metropolitana se restringiu a assegurar a preservação do valor apreendido e a conduzir os envolvidos à Polícia Civil, responsável pela investigação sobre a origem e a real motivação da transação. A quantia foi devidamente apreendida nos autos do inquérito policial instaurado”, informou, à época, a Prefeitura.
CONTRATO SUSPENSO
Logo após a suspensão do contrato, mães de pacientes atendidos no centro de reabilitação protestaram contra a interrupção dos serviços. O IHC atendia cerca de 450 crianças com transtorno do espectro autista, TDAH e outras condições.
Ao PontoPoder, a Sesau informou que “os pacientes anteriormente atendidos pelo Instituto Heitor Coelho (IHC) estão sendo remanejados para outras clínicas conveniadas ao Município”. Conforme a Pasta, até o momento, 382 pacientes já foram encaminhados para continuidade de suas terapias, após triagem no Núcleo de Atenção à Criança e ao Adolescente com Transtorno do Espectro Autista (Nutea).
“A Sesau lembra que a suspensão temporária do contrato do IHC ocorreu em obediência à recomendação feita pela Controladoria Geral do Município, em virtude de investigação em andamento pela Polícia Civil, acompanhada pelo Ministério Público (MP) e internamente pela prefeitura, que apura suspeita de superfaturamento praticado pelo instituto. A Sesau segue acompanhando o caso e está à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais”, informou o órgão em nota enviada à reportagem.
Em vídeo publicado nas redes sociais, o prefeito Glêdson Bezerra destacou que todos os passos da investigação estão sendo acompanhados pela Polícia Civil do Ceará e pelo Ministério Público do Estado (MPCE).
“Nós (a Prefeitura) temos a obrigação de fazer sua investigação interna e não podemos repassar recursos para o instituto investigado. Requeremos informações, umas foram entregues, outras não, mas sabemos que em torno de 450 pessoas são atendidas, e nenhuma ficará sem atendimento. Temos outros institutos que atendem essas crianças e iremos encaminhar até que se comprove os fundados indícios de desvio dinheiro público”, disse o prefeito.
IHC nega acusações
O Instituto Heitor Coelho contestou, no fim de agosto, a suspensão do contrato que mantinha com a Secretaria Municipal de Saúde de Juazeiro do Norte. Em nota oficial, a entidade afirmou que a medida desrespeita o direito ao contraditório e à ampla defesa e que a decisão trará graves prejuízos a mais de 450 famílias atendidas pela entidade.
Segundo o IHC, o contrato vigente em 2025, assinado no último dia 11 de junho pela própria gestão municipal, sofreu um corte de 50% em relação ao valor de 2024, caindo de R$ 268,8 mil para R$ 134,4 mil, sem aviso prévio e sem redução de atividades. A redução, sustenta a entidade, comprometeu diretamente a manutenção dos serviços e o pagamento de profissionais.
A nota também citou o episódio ocorrido em 12 de junho, quando a presidente do IHC, Rosemeire de Lima Gomes, foi abordada por dois agentes da Guarda Municipal sob suspeita de irregularidades. O caso foi levado à Delegacia Regional do Cariri, mas, segundo a entidade, o delegado descartou flagrante delito e determinou apenas a continuidade das diligências. Segundo a defesa, o dinheiro em espécie que estava com a dirigente destinava-se ao pagamento de profissionais e a despesas de um projeto para os pacientes.
O Instituto ressaltou que todos os ofícios da Secretaria de Saúde foram respondidos, apesar dos prazos considerados “inexequíveis”, como exigências de cumprimento em apenas 24 horas. Para a entidade, a suspensão do contrato afronta a Constituição, a Lei de Processo Administrativo e a nova Lei de Licitações (nº 14.133/2021), que garantem ampla defesa e contraditório em processos administrativos.
Para além da defesa jurídica, o Instituto argumentou que a decisão da Prefeitura gera impacto direto sobre os direitos fundamentais das crianças e adolescentes e de pessoas com deficiência. Por fim, o IHC lamentou os prejuízos provocados pela suspensão dos atendimentos e reafirmou a confiança na Justiça. A entidade acrescentou ainda que continuará em funcionamento com outros projetos sociais, em parceria com o Estado e com recursos de emendas parlamentares, apesar da impossibilidade de manter os atendimentos vinculados ao contrato municipal.
A nota é assinada pela presidente da entidade, Rosemeire de Lima Gomes, e pelos advogados José Edísio Xavier Bezerra Filho e Larissa Rayanne de Brito Teles Holanda.
A presidente do Instituto, Rosemeire Gomes, também divulgou um pronunciamento público em que relata ter sido alvo de uma abordagem abusiva por parte de agentes da Guarda Civil Municipal ao tentar entregar R$ 20 mil a prestadores de serviço da entidade.
Segundo o relato, ela estava em seu local de trabalho quando dois homens chegaram de capacete, sem identificação. Um deles teria sacado a arma e ordenado que ela se mantivesse imóvel. De acordo Rosemeire, somente após a chegada de policiais é que os agentes se identificaram como servidores da Guarda Municipal. “Até então eu achava que era realmente um assalto”, contou.

A presidente também criticou a suspensão do contrato sem justificativas detalhadas e sem oportunidade de defesa. Ela afirmou que a instituição nunca se negou a fornecer informações, e que todas as provas relativas ao episódio e à regularidade dos pagamentos estão registradas.











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