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Emendas milionárias não chegam a municípios do Ceará ‘esquecidos’ por parlamentares; veja quais

Com pouco mais de 6 mil habitantes e o menor Produto Interno Bruto (PIB) da região, Pacujá, no Sertão de Sobral, enfrenta uma realidade financeira severa que se assemelha a muitos municípios de pequeno e médio porte do Estado. A arrecadação própria não oferece um aporte suficiente e a gestão depende de repasses externos para manter serviços básicos e implantar novas políticas públicas. Contudo, as emendas parlamentares impositivas, que tem sido a “salvação” para muitos prefeitos, quase não chegam por lá. 

Com pouco mais de 6 mil habitantes e o menor Produto Interno Bruto (PIB) da região, Pacujá, no Sertão de Sobral, enfrenta uma realidade financeira severa que se assemelha a muitos municípios de pequeno e médio porte do Estado. A arrecadação própria não oferece um aporte suficiente e a gestão depende de repasses externos para manter serviços básicos e implantar novas políticas públicas. Contudo, as emendas parlamentares impositivas, que tem sido a “salvação” para muitos prefeitos, quase não chegam por lá.

Entre 2015 e 2024, Pacujá recebeu apenas R$ 4,2 milhões em emendas de deputados e senadores, ficando entre os municípios cearenses mais “esquecidos” pelos congressistas. E ele não está só. Jati, São João do Jaguaribe, Tarrafas e Poranga também amargam repasses que não chegam sequer a R$ 5 milhões em dez anos.

 

Esses dados, divulgados pelos Tesouro Nacional, consideram as três modalidades de emendas impositivas adotadas atualmente no País: as emendas individuais de transferência com finalidade definida — quando os parlamentares indicam a destinação final do recurso —, as emendas de bancada estaduais — que são propostas coletivamente pelos deputados e senadores de cada estado — e as emendas individuais de transferência especial (emendas Pix).

 

Depois de mostrar a realidade dos municípios mais “lembrados” pelos deputados e senadores na hora de destinar emendas, o Diário do Nordeste expõe a situação daqueles “esquecidos” pelos parlamentares. Esta reportagem integra uma série sobre os dez anos das emendas impositivas no Brasil e como o recurso é aplicado e distribuído no Ceará.

Nesta sequência de matérias, o Diário do Nordeste conversa com deputados, prefeitos, cientistas políticos e consultores de finanças públicas para traçar um panorama das transformações provocadas desde o “marco zero” das emendas impositivas até hoje. As reportagens também discutem o futuro do orçamento brasileiro e apontam caminhos para garantir mais transparência no uso dos recursos públicos.

Congresso Nacional

Antes mesmo de ganharem o status de impositivas, em 2015, as emendas parlamentares já dividiam opiniões. No entanto, o desequilíbrio na distribuição desses recursos é um um dos pontos de convergência na análise tanto de cientistas políticos quanto de gestores locais. Eles defendem alternativas para que a divisão dessas fatias do orçamento ocorra de forma mais equilibrada entre as cidades.

 

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A Constituição Federal assegura que os parlamentares são livres para escolher como irão distribuir as emendas. Alguns preferem beneficiar suas bases eleitorais, enquanto outros, como estratégia para atrair aliados, preferem apostar em locais onde possuem baixa votação. Em meio às diferentes estratégias, alguns locais — normalmente com eleitorado reduzido e contas públicas apertadas — acabam não sendo contemplados.

Além de ficarem de fora das indicações, alguns municípios também podem ter os recursos “travados” por pendências entre a prefeitura e a União ou mesmo pela falta de cobrança dos deputados.

 

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“Os números e estudos sobre esta distribuição de recursos públicos indicam que há uma grande distorção federativa, onde alguns municípios recebem vultosos recursos, enquanto outros recebem muito pouco”, aponta Eduardo Stranz, consultor especialista em finanças públicas municipais e dados e indicadores de gestão.

“No meu ponto de vista, embora as emendas sejam hoje fundamentais aos gestores, devia se ter algum outro critério de distribuição, afinal esses são recursos públicos e devem chegar a todas as cidades de forma republicana e equitativa”, defende o consultor.

O desafio de ser “lembrado”

Conforme o Tesouro Nacional, dos R$ 5,7 bilhões injetados no Ceará desde 2015, apenas R$ 2,9 milhões tiveram como destino a cidade de Jati, no Cariri. O maior aporte para a cidade, que tem 7,8 mil habitantes, ocorreu ainda em 2016, com a indicação de R$ 565,8 mil, divididos entre emendas individuais do deputado José Guimarães (PT) e do ex-parlamentar Antônio Balhmann. Em 2024, por exemplo, a prefeitura sequer foi contemplada com emendas.

 

 

No mesmo período de 10 anos, São João do Jaguaribe, quarta cidade menos populosa do Ceará, com 5,8 mil pessoas, recebeu R$ 3,2 milhões. Desse montante, R$ 500 mil foram destinados no ano passado, a partir de recursos parlamentares de Domingos Neto (PSD).

Outro município do Cariri que enfrenta uma realidade semelhante a de Jati é Tarrafas, com 7,5 mil habitantes. Desde 2015, as gestões receberam R$ 3,4 milhões de emendas impositivas. No ano passado, por exemplo, foram R$ 615,6 mil enviados pelo deputado José Guimarães.

 

 

A lista de cinco prefeituras menos contempladas tem ainda a de Poranga, no Sertão de Crateús, que, com 12 mil habitantes, recebeu R$ 3,5 milhões em dez anos. Historicamente, a cidade é uma das que recebe menor volume de recursos. Contudo, no ano passado, emendas dos deputados Mauro Filho (PDT) e AJ Albuquerque injetaram R$ 1,3 milhão para investimentos locais.

No caso de Pacujá, as primeiras emendas impositivas só chegaram em 2018 e, ao longo dos anos, as destinações não superaram a marca de R$ 1 milhão. Em 2024, por exemplo, a gestão municipal recebeu R$ 328,4 mil.

No ano passado, inclusive, o município passou por um momento de instabilidade política — o que costuma deixar os congressistas mais cautelosos na hora de escolher o local como destino para as emendas. Em setembro, o então prefeito Raimundo Filho (PSB) e o vice Zé Antônio Mão Calejada (União) foram cassados pela Justiça Eleitoral.

Em 15 de outubro, logo após o primeiro turno das eleições em todo o Brasil, a Câmara de Pacujá elegeu Rodrigo Carvalho (PP) como prefeito substituto até 31 de dezembro, quando ele passou a faixa para o atual chefe do Executivo, Pedro Allan (PSB).

 

 

As gestões de Jati, São João do Jaguaribe, Tarrafas, Poranga e Pacujá foram procuradas pela reportagem, mas não retornaram.

Desequilíbrio

Presidente da Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece) e ex-prefeito de Jaguaribara, Joacy Júnior (PSB), conhecido como Juju, reconhece que há uma “grande diferença” entre os municípios com deputados mais atuantes e aqueles que não conseguiram atrair o apoio de um parlamentar.

“Há toda uma relação política que vai levar a essa destinação de emendas, até para permitir que os parlamentares também possam ter um direcionamento e saber como é que vão ser executadas no futuro, mas (a distribuição)  pode melhorar sim”, defende.

 

“É necessário que existam critérios legítimos, objetivos e públicos de distribuição desses recursos, principalmente nessas questões de natureza local. É preciso que se diga o porquê de um recurso ser para a prefeitura A e não para a B com alguma razão relacionada à política pública, e não em relação ao interesse, seja de um ministro, de um diretor regional ou de um deputado ou senado. É preciso esses critérios que eliminem o clientelismo não só na distribuição parlamentar individualizada, mas no Executivo também”
Fernando Moutinho

Consultor de Orçamento do Senado Federal e professor universitário

 

Para a socióloga e cientista política Paula Vieira, pesquisadora do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem), da Universidade Federal do Ceará, essa desigualdade de repasses acaba escancarando disparidades estruturais entre os municípios.

“Essa é uma das desvantagens do orçamento impositivo, porque essas desigualdades de base dos municípios, elas gritam, porque há um direcionamento mais específico.”, afirma. Ela ressalta que o problema é ainda mais profundo e remete a uma discussão antiga do sistema político brasileiro.

“Desde a Constituição de 1988, há um debate sobre um modelo distrital, que faria com que cada território tivesse uma espécie de marcação territorial e, necessariamente, tivesse um representante. Hoje, isso não existe, seria uma forma de garantir a melhor distribuição desses recursos”, conclui.

 

Créditos

Igor CavalcanteRepórter/Infografia
Jéssica WelmaEdição
Wagner MendesEdição
Louise DutraIlustração
Karine ZaranzaCoordenadora de Jornalismo
Ívila BessaGerente de Jornalismo
Gustavo BortolliDiretor de Jornalismo
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Carlos Alberto

Oi, eu sou o Carlos Alberto, radialista de Campos Sales-CE e apaixonado por futebol. Tenho qualidades, tenho defeitos (como todo mundo), mas no fim das contas, só quero viver, trabalhar, amar e o resto a gente inventa!

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