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Professor descobre nova espécie de minicacto no sertão do CE, mas planta já tem risco de extinção

Uma nova espécie de cacto, menor do que outros mais comuns no Ceará, foi descoberta durante uma expedição de pesquisadores botânicos ao sertão do Estado. Embora a descoberta tenha sido animadora, a planta já foi considerada ameaçada de extinção por conta de sua ocorrência restrita a poucas localidades.

Planta tem ocorrência em pequena área geográfica e pode estar sujeita ao desmatamento

Escrito por
Nícolas Paulinonicolas.paulino@svm.com.br
03 de Junho de 2025 – 07:00

(Atualizado às 07:06)
A imagem mostra um pesquisador ajoelhado no chão de uma área de vegetação seca, observando e anotando informações em um caderno. Ele está próximo a um grupo de cactos e usa equipamentos de medição, como uma trena e um medidor amarelo.
Legenda: Pesquisador Marcelo Teles participou de estudo inicial em 2009 e de novos levantamentos em 2022, em Santa Quitéria e Canindé
Foto: Acervo do pesquisador Marcelo Teles

Uma nova espécie de cacto, menor do que outros mais comuns no Ceará, foi descoberta durante uma expedição de pesquisadores botânicos ao sertão do Estado. Embora a descoberta tenha sido animadora, a planta já foi considerada ameaçada de extinção por conta de sua ocorrência restrita a poucas localidades.

A espécie foi batizada de Tacinga mirim – esta segunda palavra, na língua indígena nheengatu, quer dizer “pequena” – e é classificada como uma versão em miniatura da Tacinga palmadora, conhecida no Nordeste como palmatória. Essa confusão inicial, inclusive, foi o motivo de ela não ter sido catalogada antes.

Em 2009, durante um inventário botânico em Santa Quitéria, um grupo de pesquisadores se deparou pela primeira vez com o cacto de menos de um metro de altura. Na época, porém, eles o identificaram equivocadamente como o T. palmadora.

Já em dezembro de 2022, outra viagem percorreu Santa Quitéria, Canindé e áreas adjacentes. Nas duas expedições, estava o biólogo Marcelo Oliveira Teles de Menezes, professor do campus Fortaleza do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE).

Segundo ele, a nova espécie catalogada “sempre foi conhecida pelos povos originários e comunidades tradicionais da região”, mas cientificamente só foi estudada pela primeira vez há 13 anos – e mesmo assim confundida com a palmatória.

 

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Em 2021, o botânico britânico Nigel Taylor, que promoveu a expedição de 2009, estava revisando dados dos cactos brasileiros e cogitou pela primeira vez que as plantas de Santa Quitéria poderiam pertencer a uma espécie diferente.

“Entramos em acordo que seria interessante reavaliar a identidade delas de forma mais criteriosa. Somente no fim de 2022, a mesma população estudada anteriormente foi revisitada para sanar essa dúvida”, explica Marcelo.

As análises morfológicas (na aparência) e cromossômicas foram feitas em parceria com a pesquisadora Lânia Isis Ferreira Alves, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), e confirmaram se tratar de uma espécie ainda não catalogada pela ciência. O estudo foi publicado oficialmente em 2024.

A nível mais profundo, a palmatória tem 22 cromossomos, enquanto a planta menor apresenta 44. O T. mirim também tem menor densidade de espinhos (máximo de três por aréola, contra sete da outra), bem como flores ligeiramente maiores e bem abertas.

 

Ilustração com fundo preto mostrando detalhes parciais do cacto Tacinga mirim, como flores e espinhos
Legenda: Quadro demonstrativo das partes do Tacinga mirim
Foto: Acervo do pesquisador Marcelo Teles

 

Ameaça de extinção

A principal população do T. mirim está na localidade de Piabas, em Santa Quitéria, mas outra foi encontrada na reserva privada Imburanas da Volta, em Canindé.

 

Essa restrição geográfica – de apenas 36 km² – é um dos motivos para cogitar sua inclusão na categoria “Ameaçada” da Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês). Até o momento, ela ainda não foi avaliada formalmente.

 

Segundo o professor Marcelo Teles, como a planta foi descrita há pouco tempo, é preciso aprender mais sobre a espécie, inclusive sobre sua distribuição geográfica. Por isso, sua preservação é essencial.

Contudo, há muitos desafios. De acordo com o Projeto MapBiomas, os municípios em que o T. mirim ocorre sofreram perda de vegetação natural variando de 4 a 16% de extensão entre 1985 e 2022, tendo como principal causa o desmatamento associado à agricultura e à pecuária.

O pesquisador aponta algumas hipóteses para essa restrição:

  • Espécie “novata”: como o processo evolutivo é dinâmico, ela pode ter se originado há pouco tempo (ou está em pleno processo de especiação) e ainda não teve oportunidade de se dispersar para outros ecossistemas/regiões
  • Habitat muito restrito e/ou um nicho ecológico muito específico
  • Degradação dos ecossistemas: devido à perda de habitat, algumas espécies estão entrando em processo de extinção

“Daí a importância de estudar e proteger a Tacinga mirim: precisamos confirmar se ela realmente tem a distribuição restrita ao sertão cearense e, se for o caso, compreender porque sua distribuição é tão restrita e adotar medidas de proteção para evitar sua extinção”, alerta.

 

Foto aproximada do cacto da espécie Tacinga mirim, verde, com dois espinhos por aréola e flor rosa ainda não aberta
Legenda: Cacto tem menos espinhos por cada aréola (ponto de crescimento) em comparação à palmatória
Foto: Acervo do pesquisador Marcelo Teles

 

Por que preservar os cactos da caatinga?

A proteção de espécies de cactos não se limita ao conhecimento científico descrito nos estudos: essas plantas desempenham um papel importante na caatinga, uma região com clima predominantemente semiárido. No Ceará, por exemplo, o regime de chuvas se concentra no primeiro semestre, deixando o segundo à mercê da estiagem.

Marcelo Teles lembra que, sem água, poucas plantas conseguem fazer fotossíntese e a maior parte da vegetação entra em um “estado de dormência” até que volte a chover. Assim, todo o ecossistema reduz sua atividade, pois os recursos vegetais são a base das redes alimentares.

 

Os cactos fazem parte de um pequeno conjunto de plantas que, por meio de diferentes estratégias fisiológicas, conseguem fazer fotossíntese durante todo o ano, inclusive durante a estação seca. Eles literalmente armazenam água para usar quando não está chovendo.
Marcelo Teles

Pesquisador e professor do IFCE

 

Graças a esse estoque de água, os cactos ajudam a manter a oferta de recursos alimentares (tecidos suculentos, néctar, pólen e frutos) para animais herbívoros e onívoros durante toda a estação seca. 

Além disso, mantêm condições favoráveis para microrganismos ao redor de suas raízes. “Sem os cactos para oferecerem esses recursos na estação seca, todo o funcionamento ecológico da caatinga fica comprometido, incluindo a capacidade do solo de manter sua fertilidade natural”, garante o pesquisador.

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Carlos Alberto

Oi, eu sou o Carlos Alberto, radialista de Campos Sales-CE e apaixonado por futebol. Tenho qualidades, tenho defeitos (como todo mundo), mas no fim das contas, só quero viver, trabalhar, amar e o resto a gente inventa!

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