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Projeto no CE usa líquido da castanha como combustível para substituir petróleo em siderúrgicas

Cientistas da Universidade Federal do Ceará (UFC) desenvolveram uma tecnologia que transforma o líquido da castanha do caju (LCC) em combustível para indústrias siderúrgicas. A tecnologia pode ser uma solução para a transição energética do setor, substituindo derivados do petróleo e diminuindo o uso de combustíveis auxiliares.

Tecnologia da UFC é uma das alternativas que favorece a transição energética do setor

Escrito por
Clarice Nascimentoclarice.nascimento@svm.com.br
11 de Junho de 2025 – 07:10

A imagem mostra um béquer de vidro transparente cheio de um líquido escuro, quase preto, com algumas bolhas pequenas na superfície. Ao lado do béquer, há algumas amostras de material sólido. À direita, há quatro pedaços maiores de castanha, oval e cinza escura. À esquerda, há uma pequena pilha de material granulado, também escuro. O fundo, desfocado, sugere um ambiente de laboratório ou industrial, com algumas caixas ou prateleiras ao fundo.
Legenda: O líquido da castanha do caju (LCC) é um óleo escuro e viscoso, que corresponde a 25% do peso da casca da castanha, e é gerado por meio do cozimento para a extração das amêndoas da castanha
Foto: Guilherme Silva/UFC

Cientistas da Universidade Federal do Ceará (UFC) desenvolveram uma tecnologia que transforma o líquido da castanha do caju (LCC) em combustível para indústrias siderúrgicas. A tecnologia pode ser uma solução para a transição energética do setor, substituindo derivados do petróleo e diminuindo o uso de combustíveis auxiliares.

Patenteada no fim de abril deste ano, a inovação já está em negociação para fins de licenciamento e comercialização. E, se for utilizado, traz uma série de vantagens para o meio ambiente, como a redução das emissões de carbono e outros gases do efeito estufa.

“O processo siderúrgico precisa de carbono para o ferro virar aço. Para isso, eles usam o carvão mineral. Agora, o LCC entra como um grande colaborador desse processo”, detalha o professor do Departamento de Química Orgânica e Inorgânica da UFC, Diego Lomonaco, em entrevista ao Diário do Nordeste.

A tecnologia foi desenvolvida durante o doutorado de Leandro Miranda Nascimento, sob orientação do professor Lomonaco. A pesquisadora Selma Elaine Mazzetto também é listada como inventora na carta patente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).

 

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EXTRAÇÃO DO LÍQUIDO

Hoje, o Ceará mantém a liderança na fabricação de castanha de caju, com 71,2% da produção total do Brasil (141 mil toneladas), conforme dados do Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA).

Nessas fábricas, são realizados processos para extrair a amêndoa da castanha-de-caju. Essa é a parte comestível do fruto, rica em nutrientes e gorduras monoinsaturadas, conhecidas como ‘gorduras boas’.

A extração das amêndoas no Brasil ocorre por meio do cozimento, enquanto no resto do mundo a extração se dá pela quebra das cascas. O líquido da castanha do caju (LCC) é um óleo escuro e viscoso, que corresponde a 25% do peso da casca da castanha, e é gerado por meio desse cozimento.

Essa substância é difícil de ser descartada no ambiente devido à lenta biodegradabilidade e ao excesso produzido. Assim, o LCC gerado nas empresas produtoras de castanha são armazenados em tanques e vendido como combustível em cadeiras, já que possui um elevado poder calorífico.

Dentre os vários focos de atuação da siderurgia, uma delas é a aglomeração de finos de minérios. Esse processo transforma as pequenas partículas de minérios em corpos de maior dimensão para ser usados, por exemplo, para formar o aço.

Hoje, esses finos de minérios são ‘colados’ em processos sob altas temperaturas, que utilizam a reação de combustão do carvão mineral como fonte térmica, emitindo grande quantidade de carbono (CO₂).

Com a inovação patenteada, o LCC vai atuar como componente-chave em uma nova geração de aglomerantes, via briquetagem, desenvolvidos para a siderurgia. A formulação exclusiva vai se infiltrar entre as partículas de minério, criando ligações de alta coesão e estabilidade térmica, sem usar combustíveis auxiliares e aditivos convencionais.

 

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Para a pesquisa, o LCC utilizado foi cedido por uma empresa exportadora de castanha de caju localizada no bairro Antônio Bezerra, próximo ao Campus do Pici da UFC.

Lomonaco afirma que a siderurgia, uma das indústrias mais poluentes do mundo, pode utilizar a inovação para revolucionar o setor. “O uso do LCC dentro da indústria siderúrgica não tem nada de negativo para o meio ambiente. Na verdade, está trocando o carbono fóssil por um carbono neutro, sustentável”, diz.

O gás carbônico gerado pela queima do LCC é considerado neutro do ponto de vista ambiental, já que esse CO₂ composto no óleo foi previamente capturado da atmosfera pela própria planta de caju durante seu crescimento.

Assim, a técnica troca a liberação de CO₂ fóssil (aprisionado no subsolo por eras) por um que já estava na atmosfera, criando uma “equação neutra” de carbono.

IMPACTOS ECONÔMICOS

 

A imagem mostra um homem cientista, usando um jaleco branco. Ele segura com as duas mãos um pequeno recipiente de vidro em formato de gota, que contém um líquido de duas fases: uma camada superior amarelada e uma camada inferior escura, quase preta. O homem tem cabelos curtos e escuros, barba por fazer e uma expressão concentrada enquanto observa o conteúdo do recipiente. Ao fundo, parcialmente desfocado, pode-se ver uma superfície amarela e uma área branca que lembra uma parede ou equipamento de laboratório.
Legenda: A tecnologia foi desenvolvida sob orientação do professor do Departamento de Química Orgânica e Inorgânica da UFC, Diego Lomonaco, que estuda o líquido da castanha de caju há quase 20 anos
Foto: Guilherme Silva/UFC

 

O uso do LCC garante uma série de vantagens econômicas e operacionais para a indústria. Como o líquido não gera cinzas, o pós-processamento é simplificado. Ou seja, há menos escória a tratar, menos resíduos a descartar e maior eficiência na recuperação metálica.

Além disso, a mistura com o óleo é compatível com os processos industriais existentes, sendo passível de ser adotada sem alterações nas plantas industriais. Essa característica da tecnologia é chamada de “plug and play”.

Outra questão financeira é o baixo custo do LCC diante dos aglomerantes atualmente utilizados pela indústria siderúrgica. Com isso, existem ainda outros benefícios econômicos indiretos como a redução de despesas com tratamento de resíduos e gases tóxicos e potencial geração de créditos de carbono.

COMERCIALIZAÇÃO

O caminho para a expedição da carta patente foi marcado por longos anos de pesquisa, diversos ensaios e ajustes até chegar na formulação atual. O produto também foi validado com parceiros industriais.

“As nossas pesquisas, cada vez mais, indicam que o LCC tem um potencial tecnológico muito grande e essa não foi diferente. Ela mostrou uma perspectiva inédita, nunca ninguém tinha trabalhado com LCC na área de siderurgia”, diz o professor Diego Lomonaco.

A titularidade da patente é dividida entre a Universidade Federal do Ceará (UFC), que encabeçou o desenvolvimento científico e os testes laboratoriais, e as empresas Regenera Bioenergia Indústria e Comércio Ltda. e Prorad Projetos de Engenharias, Análises Mercadológicas e Internacionais Ltda.

A parceria com as empresas foi fundamental para a etapa de desenvolvimento tecnológico, escalonamento e estratégias de aplicação prática. A UFC terá direito à participação nos lucros provenientes do licenciamento e comercialização da tecnologia.

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Carlos Alberto

Oi, eu sou o Carlos Alberto, radialista de Campos Sales-CE e apaixonado por futebol. Tenho qualidades, tenho defeitos (como todo mundo), mas no fim das contas, só quero viver, trabalhar, amar e o resto a gente inventa!

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