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Enel Ceará reteve R$ 8,7 milhões de doações de clientes a instituições filantrópicas, diz Decon

A Enel Ceará reteve cerca de R$ 8,7 milhões do dinheiro doado por clientes a instituições filantrópicas nos últimos quatro anos. Segundo o Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon), os valores eram descontados sem o conhecimento dos consumidores. A Enel Ceará informou à reportagem do Diário do Nordeste que os doadores estavam cientes dos descontos. 

A companhia de energia informou que os clientes tinham ciência dos descontos

Escrito por
Mariana Lemosmariana.lemos@svm.com.br
02 de Julho de 2025 – 06:44

(Atualizado às 06:48)
Fachada da sede da Enel Ceará em Fortaleza
Legenda: Enel Ceará foi multada em R$ 16 milhões pelo Ministério Público por reter parte de doações de clientes
Foto: Davi Rocha

Enel Ceará reteve cerca de R$ 8,7 milhões do dinheiro doado por clientes a instituições filantrópicas nos últimos quatro anos. Segundo o Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon), os valores eram descontados sem o conhecimento dos consumidores. A Enel Ceará informou à reportagem do Diário do Nordeste que os doadores estavam cientes dos descontos.

Nesta segunda-feira (31/6), a empresa de energia foi multada em R$ 16 milhões pelo Decon por reter parte das doações sem o conhecimento dos clientes.

A Enel retém 10% do valor das doações a instituições filantrópicas realizadas pela conta de luz. Além disso, a empresa estaria cobrando outra taxa de R$ 13,95 sobre alguns dos valores arrecadados.

O Decon também identificou a existência de cobranças por doações que não eram autorizadas pelos clientes e dificuldades impostas pela concessionária para cancelar as doações.

Segundo Gisele Jucá, gerente de Atendimento da Enel Ceará, a cobrança de parte do valor doado é necessária para custear o processamento da cadeia de faturamento, arrecadação e repasse de doações.

A Enel afirma que todos os valores retidos estão previstos nos contratos assinados com as instituições filantrópicas.

“A instituição filantrópica tem uma cadeia de fornecedores, muitas contratam empresas de call center para fazer prospecção de ligações e contratam distribuidoras [de energia] como fornecedores. A Enel faz parte da cadeia de fornecedores que a instituição filantrópica tem”, aponta Jucá.

Do total retido pela distribuidora, R$ 8,2 milhões correspondem aos 10% cobrados por doação. Já R$ 513 mil correspondem à tarifa variável de R$ 13,95.

CONSUMIDORES NÃO SABIAM DE PARCELA RETIDA

A apuração do Ministério Público começou a partir de diversas reclamações de clientes que tentavam cancelar as doações feitas por meio da conta de luz, mas não conseguiam, explica o promotor de Justiça Hugo Xerez, secretário-executivo do Decon.

“Verificamos que a Enel impunha uma série de dificuldades para o cancelamento, orientando os consumidores a procurarem a instituições filantrópicas. E também detectamos que a empresa se apropriava de parte das doações sem que os consumidores soubessem”, afirma.

É um direito do consumidor ser informado de qualquer uso do seu dinheiro, ressalta o secretário-executivo. Além da ação administrativa que resultou na multa, também deve ser instaurada ação judicial sobre o caso.

O servidor público David Moraes de Andrade, de 43 anos, foi surpreendido com a informação de que a empresa retinha parte dos valores de doação. Ele contribuiu por anos com o hospital infantil filantrópico Sopai por meio de sua conta de luz.

“Os contratos iniciais sempre foram informativos da destinação da renda, que seria convertido totalmente para a entidade, e era a Enel que fazia a anotação do valor. É uma surpresa, porque parecia um serviço de bom grado”, lembra.

DIFICULDADE PARA CANCELAR DOAÇÕES

A jornalista Larissa Pacheco, 32 anos, também fazia doação mensal por sua conta de luz desde 2020 para a Santa Casa de Misericórdia, sem saber dos valores retidos. Ao descobrir os valores, tentou cancelar a doação, mas enfrentou dificuldades.

“Liguei para a Enel para cancelar e fui informada pela atendente que eu teria que ligar também para a instituição para confirmar. Caso eu não fizesse o contato com a Santa Casa, o cancelamento feito pela Enel seria apenas provisório, com a cobrança retornando nos meses seguintes”, conta.

O Decon identificou que a Enel não oferece alternativas para o cancelamento das cobranças.

“Além de arbitrária, é ilegal e abusiva, uma vez que a agência reguladora dispõe expressamente que os usuários podem solicitar a exclusão a qualquer tempo às distribuidoras”, destaca a decisão administrativa.

Segundo Gisele Jucá, gerente da Enel, os clientes que desistirem da doação podem entrar em contato com os canais de telefone e atendimento presencial.

“Esse pedido é feito de forma imediata. O cliente tem total acesso, tanto pode falar conosco como pedir à própria instituição”, afirma.

DINHEIRO RETIDO PARA ‘DESPESAS OPERACIONAIS’

Em manifestação ao Decon, a Enel Ceará informou que cerca de 40% do valor retido das doações são utilizados para cobrir despesas operacionais da doação.

Os outros 60% são destinados para a modicidade tarifária – para impedir o aumento da tarifa de energia aos consumidores. A decisão do MPCE destaca que não houve detalhamento dos custos e de como os valores são revertidos em manutenção das tarifas.

O promotor de Justiça Hugo Xerez afirma que, de início, a empresa negou que ficava com parte das doações sem que os clientes soubessem. O diretor-presidente da empresa Enel Distribuição Ceará, José Nunes de Almeida Neto, foi ouvido no procedimento.

“No primeiro momento, a Enel negou no procedimento que recebia esses valores. O presidente assinou um documento formal, dizendo que nunca recebeu nenhum centavo das doações. Só que as investigações caminharam, o procedimento caminhou e a empresa ficou em uma situação que não tinha como negar”, aponta Hugo Xerez.

POR QUE A ENEL DESCONTAVA 10% DAS DOAÇÕES?

Em nota, a Enel Ceará informou que, de acordo com a Resolução Normativa da Aneel n. 1000/2021, realiza a arrecadação da contribuição ou doação em sua fatura de energia elétrica, mediante prévia autorização de débito concedido pelos clientes doadores responsáveis pela unidade consumidora e/ou por seu cônjuge cadastrado na distribuidora.

“A companhia informa que é de responsabilidade das instituições filantrópicas a captação dos doadores, bem como a obtenção da autorização da cobrança junto ao cliente. A companhia esclarece ainda que a contribuição pode ser cancelada pelo consumidor a qualquer momento mediante solicitação nos canais de atendimento da distribuidora ou da instituição”, disse a empresa nessa segunda-feira.

Conforme a resolução da Aneel, a distribuidora pode incluir na fatura contribuições ou doações para entidades legalmente reconhecidas e com fins de interesse social. A resolução explica ainda que:

  • os valores incluídos devem ser discriminados na fatura;
  • a inclusão deve ser comprovadamente autorizada, mediante manifestação voluntária do consumidor e demais usuários; e
  • o consumidor e demais usuários podem, a qualquer tempo, solicitar a exclusão das cobranças à distribuidora.

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Carlos Alberto

Oi, eu sou o Carlos Alberto, radialista de Campos Sales-CE e apaixonado por futebol. Tenho qualidades, tenho defeitos (como todo mundo), mas no fim das contas, só quero viver, trabalhar, amar e o resto a gente inventa!

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