O grupo ainda é ligado ao tráfico de drogas, tráfico de armas, corrupção, entre outros crimes, segundo a investigação do Ministério Público do Ceará

A suposta organização criminosa formada por policiais militares, alvo da Operação Kleptonomos, deflagrada pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) na última terça-feira (29), faturou até R$ 300 mil com extorsões a criminosos, em Fortaleza, durante um período aproximado de três anos. O grupo ainda é ligado ao tráfico de drogas, tráfico de armas, corrupção, entre outros crimes, segundo a investigação do MPCE.
“A gente estima, assim, uma faixa de 200 a 300 mil reais só de extorsão. Isso é algo estimado, não é algo (oficial) que a gente tem ainda. A gente ainda está fazendo o balanço dos valores que realmente eles conseguiram alcançar com essas extorsões, com esse comércio de drogas e comércio de armas”, explica o coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco), o promotor de justiça Adriano Saraiva.
Segundo o coordenador do Gaeco, os policiais militares identificavam criminosos que podiam estar na posse de ilícitos ou eram considerados foragidos da Justiça (pois estavam com mandados de prisão em aberto) para extorqui-los, na região da Grande Messejana. Conforme o promotor, a quadrilha utilizava até sistemas oficiais da Polícia para obter as informações e realizava as abordagens em serviço, com uso de farda e viatura da Polícia Militar do Ceará (PMCE).
“Muitas vezes, eles (policiais) abordavam uma pessoa com um ilícito e extorquia essa pessoa, cobrava uma vantagem indevida. Essa pessoa acabava cedendo e pagando, e a equipe policial deixava de instaurar um procedimento”, afirma Saraiva.
Em um dos casos, a composição policial recebeu mais de R$ 3 mil para não prender um homem que estava com mandado de prisão em aberto. O Gaeco identificou diversos crimes cometidos pela organização criminosa entre o fim de 2022 e os dias atuais.
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Aliança com membros de facção criminosa
Além das extorsões, os policiais militares formavam “um verdadeiro consórcio com traficantes” de localidades específicas, segundo o coordenador do Gaeco.
O grupo de PMs atuava principalmente na comunidade do Pôr do Sol, no Coaçu e na Paupina – que ficam na Grande Messejana. A reportagem apurou que o tráfico de drogas, nessas regiões, é dominado pela facção carioca Comando Vermelho (CV).
As investigações do Gaeco mostraram que os agentes de segurança do Estado recebiam “cotas”, pagas com frequência, para proteger os membros da facção que predomina na região.
Segundo Adriano Saraiva, a investigação começou com uma denúncia anônima, no fim de 2022. Durante quase três anos, o Gaeco aprofundou a investigação contra os policiais militares para chegar à denúncia contra os PMs e à deflagração da Operação Kleptonomos, na última terça-feira.
Conseguimos identificar inúmeras situações, que estão narradas na denúncia. Não só de recebimento de cota, mas de extorsões a traficantes, de permitir que esses traficantes comercializassem droga, armas e praticassem todo tipo de ilícito, naquela localidade. Esses policiais, esses ‘pseudopoliciais’, comunicavam quando a polícia ia fazer alguma abordagem.”
PMs são presos e afastados das funções
A Operação Kleptonomos foi deflagrada para cumprir 16 mandados de prisão preventiva e 17 mandados de busca e apreensão, contra policiais militares acusados de integrar a organização criminosa, na última terça-feira (29). Os mandados foram cumpridos em Fortaleza, Itaitinga, Maracanaú, Pacoti e Russas, além de Maceió (no Estado de Alagoas).
Segundo o MPCE, o nome da Operação tem origem no grego clássico, a partir da junção de duas raízes: “klepto”, que significa “roubar” ou “apropriar-se ilicitamente”, e “nomos”, que representa “lei”, “ordem” ou “norma estabelecida”. “Essa composição literal — ‘aquele que rouba a lei’ — traduz de forma direta a figura de quem usurpa a autoridade legal, cria regras próprias ou impõe um sistema paralelo de poder, em afronta ao ordenamento legítimo”, pontua o Órgão.
foram presos, enquanto dois não foram localizados e são considerados foragidos da Justiça. Um suspeito ainda foi preso em flagrante, por estar na posse de maconha e cocaína. Uma prisão foi realizada em Maceió, onde um militar tinha residência, com apoio do Ministério Público de Alagoas.
O Ministério Público já ofereceu denúncia à Justiça contra os 16 policiais investigados por crimes como integrar organização criminosa, valendo-se da condição de servidor público; corrupção passiva; extorsão qualificada; e por colaborarem, como informantes, com grupo para a prática de tráfico de entorpecentes. A denúncia foi recebida, e os militares viraram réus.
Os policiais militares investigados também foram afastados das funções, por decisão judicial. A Vara da Auditoria Militar também decretou a quebra do sigilo dos dados de aparelhos telefônicos apreendidos com os PMs.
Com a apreensão dos celulares e o acesso aos dados, o Gaeco espera chegar a mais crimes e a outros suspeitos de integrar a organização criminosa, já que o grupo combinava as ações por um grupo mantido no aplicativo WhatsApp.
Polícia Militar diz que não admite desvios de conduta
O coordenador de Polícia Judiciária Militar e Disciplina da PMCE, coronel Marcus Monteiro, garantiu que “a Polícia Militar do Estado do Ceará não admite esses desvios de condutas” e garantiu que vão haver mais operações policiais.
Aqueles que se sentirem à vontade para praticar delitos contra a Corporação, a carreira vai ser bem curta. Nós estamos fiscalizando, nós estamos de olho e nós vamos combater qualquer tipo de desvio de conduta e irregularidade, dentro da nossa Instituição.”
A defesa de um sargento preso na operação, composta pelos advogados Micias Bezerra e Francisco José Sabino Sá, informou que “tomou conhecimento da operação policial, na manhã de hoje, que resultou na prisão de seu cliente e que a partir de então solicitará acesso aos autos e todos os elementos de investigação, para ciência do conteúdo”.
“A Defesa adianta ser improvável que o Sargento esteja envolvido nos crimes investigados, uma vez que está de licença médica para tratamento de saúde, há mais de um ano, em razão de grave enfermidade de que é portador”, sustenta a defesa.
Por fim, a defesa “reitera sua confiança na Justiça Cearense e no respeito ao devido processo legal. Esclarece, ainda, que qualquer tentativa de julgamento antecipado, sobretudo no âmbito midiático, viola os princípios constitucionais da presunção de inocência, do contraditório e da ampla defesa, pilares fundamentais do Estado Democrático de Direito”.
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