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Há 35 anos no Conjunto Esperança, ‘O Rei da Tripa’ faz sucesso com cardápio raiz e jeitão de casa

Uma casa duplex, sem placa de identificação e numa rua de pouco movimento: é nesse recanto simples que há 35 anos funciona um dos integrantes da monarquia gastronômica cearense. Chico 60 - O Rei da Tripa faz sucesso no Conjunto Esperança, com muita história para contar. A tradição demarca a fama e o alcance do negócio, capaz de ocupar lugar privilegiado na realeza do sabor.

Fundado em 1990 por ‘Chioco 60’, restaurante entrega experiência gastronômica à altura do paladar cearense; tripa de porco assada é referência, mas não apenas

Escrito por
Diego Barbosadiego.barbosa@svm.com.br
31 de Julho de 2025 – 07:00

Na imagem, o prato tripa de porco com farofa e molho de pimenta, servido no Chico 60 - O Rei da Tripa, localizado no Conjunto Esperança, em Fortaleza
Legenda: Limpeza e sabor são dois dos maiores atributos na tripa de porco servida no Chico 60 – O Rei da Tripa, no bairro Conjunto Esperança
Foto: Thiago Gadelha

Uma casa duplex, sem placa de identificação e numa rua de pouco movimento: é nesse recanto simples que há 35 anos funciona um dos integrantes da monarquia gastronômica cearense. Chico 60 – O Rei da Tripa faz sucesso no Conjunto Esperança, com muita história para contar. A tradição demarca a fama e o alcance do negócio, capaz de ocupar lugar privilegiado na realeza do sabor.

Motivos não faltam. Cardápio raiz, clima informal de casa e a própria trajetória do empreendimento saltam aos olhos tanto quanto a comida. Há um capricho singular no preparo dos pratos. “Dois dos nossos diferenciais são sabor e limpeza”, diz Antônio Marcos da Silva do Monte, proprietário do empreendimento, com funcionamento de domingo a domingo.

tripa de porco frita, feito o nome do recanto anuncia, é o verdadeiro carro-chefe, e herda esses dois atributos importantíssimos: limpinha e crocante na medida certa, faz a festa de quem gosta de uma boa dose de comida típica no prato. Ela acompanha farofa, limão e molho de pimenta com fabricação original da casa. Tudo uma delícia.

 

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O prato custa R$ 54 e serve bem pelo menos três pessoas. Segundo o proprietário, é comum a clientela comprar junto à refeição outro item cobiçado do cardápio: o arrumadinho, composto por cuscuz, feijão, calabresa, carne de charque, carne do sol e verdura. “Ele é um acompanhamento, e a tripa o prato principal”.

A esses verdadeiros diamantes para o paladar, somam-se outros diversos pratos, a exemplo de mão de vaca, paneladasarrabulhobuchada, carne do sol, cavala frita, bisteca de porco, feijão verde, gostosinho e torresmo. Até sanduíches estão inclusos – “para agradar também as crianças”, conforme o proprietário – e sobremesas, como pudim e mousse.

 

Na imagem, os pratos panelada e sarrabulho, típicos do cardápio do Chico 60 - O Rei da Tripa, localizado no Conjunto Esperança, em Fortaleza
Legenda: Sarrabulho e panelada são outros pratos do cardápio do Chico 60 – O Rei da Tripa
Foto: Thiago Gadelha

 

A tripa, contudo, reina absoluta, e orquestra todos os outros sabores ao redor dela. “Nossa tripa não leva óleo. Se você levá-la para casa, mesmo sem colocar na geladeira, cinco dias depois basta esquentar no microondas que fica do jeito que sai aqui, na hora: super crocante. Tiramos toda a gordura de cima, não fica nada, apenas a pelinha seca, coisa muito boa”.

Como o restaurante nasceu

Além desse jeitão de refeição preparada no próprio lar e uma informalidade que conquista, a história do Rei da Tripa é boa de saber. O negócio abriu as portas em 1990 por Francisco Chagas Cavalcante Filho. Natural de Redenção – tal qual o atual proprietário do restaurante, diga-se de passagem – o empresário ganhou o apelido de Chico 60 por um fato inusitado.

Na juventude, venceu uma aposta na qual consistia em ingerir a maior quantidade possível de mangas. O concorrente comeu 38; Francisco, por sua vez, colocou para dentro 60 delas, cravando ali mesmo o epíteto que o acompanharia por toda a vida. A alcunha serviu para nomear o empreendimento, nascido no mesmo bairro e endereço onde está até hoje.

 

 

 

 

 

Na imagem, Antônio Marcos da Silva do Monte, proprietário do Chico 60 - O Rei da Tripa, localizado no bairro Conjunto Esperança, em Fortaleza
Legenda: Sem óleo no cozimento, tripa de porco servida no Chico 60 – O Rei da Tripa tem como principais características a limpeza e o sabor
Foto: Thiago Gadelha

 

Outros detalhes venceram o tempo e seguem intactos: o fato de a casa não ter placa identificando o restaurante, por exemplo, já era estratégia cultivada desde o começo. Serviu para que, quem chegasse a fim de se alimentar no local, fosse realmente alguém de conhecimento do dono, construindo ali um público selecionado.

Aos poucos, claro, o alcance foi aumentando, fazendo com que, pela maestria do serviço oferecido, Chico fosse proclamado Rei da Tripa – embora continuasse o espírito de manter o recanto tal qual uma simples casa duplex. “Com o tempo, seu Chico cansou devido ao extenso tempo de trabalho, pois ele nunca tirava férias, apenas durante seis dias do ano – no Carnaval e na Quinta e Sexta-feira Santa. Então, eu assumi”, divide Marcos.

Outrora garçom no estabelecimento, ele aprendeu tanto com Chico 60 quanto com a esposa do antigo dono a preparar cada quitute com o máximo de qualidade possível. Em 2023, assumiu integralmente o negócio, e confessa ser desafio manter a tradição do espaço. Confia, contudo, nos ensinamentos repassados pelos antecessores, e não pretende mudar nada no panorama do restaurante – do modo de servir até a discrição charmosa que possui.

 

Na imagem, fachada do Chico 60 - O Rei da Tripa, localizada no Conjunto Esperança, com o proprietário, Antônio Marcos da Silva do Monte à frente da casa
Legenda: Fachada do Chico 60 – O Rei da Tripa lembra a frente de qualquer casa residencial; segundo proprietário, ausência de placa é estratégica
Foto: Thiago Gadelha

 

“A maioria de nossos clientes vêm de outros bairros, sendo domingo o dia ‘mais quente’ do negócio. Recebemos gente principalmente por recomendação – de um conhecido, de um amigo ou porque viu pela internet. Nosso ambiente é familiar, não temos zoada (a única é do pessoal conversando), não tem música ao vivo, e preferimos continuar assim”, diz Marcos.

Diariamente, ele acorda às 5h da manhã para cuidar de toda a logística da casa. Compra a maioria dos insumos na Ceasa, negocia a tripa com fornecedor próprio, e então parte para comandar a equipe de seis funcionários sob a própria tutela. Tanto trabalho dá resultado: diz ser feliz no estabelecimento. “Quem come, gosta; quem nunca comeu e quer ter a primeira experiência, indico Chico 60”.

A história da tripa de porco

Na tradição de aproveitamento integral do animal é que se encontram as origens da tripa de porco. A prática sempre foi comum em culturas de povos originários de diversas regiões do Brasil. Mediante a chegada de europeus e tribos africanas, o hábito se intensificou e ganhou novas técnicas, inclusive no Nordeste brasileiro.

“No Ceará, a popularização da tripa está ligada à herança sertaneja, onde nada se desperdiçava e cada parte dos animais era valorizada. O prato ganhou destaque pela presença em feiras, mercados e barracas de comida de rua, sendo associado à comida de tradição, saborosa e acessível”, explica Bruno Modolo, professor da Escola de Gastronomia Social Ivens Dias Branco e chef de cozinha.

 

Na imagem, tripa de porco servida no Chico 60 - O Rei da Tripa, localizado no bairro Conjunto Esperança, em Fortaleza
Legenda: Segundo pesquisador, a tripa de porco é o intestino do animal, e precisa ser devidamente higienizada para ser preparada
Foto: Thiago Gadelha

 

Fresca, a tripa serve, ainda, para confecção de linguiças e embutidos, e também compõe pratos como panelada e sarrabulho. A técnica de fritar ou assar em fogo direto para desidratar e conservar por mais tempo ajudou a criar sabor marcante e textura crocante. No ato de servir, a farofa é apontada como companheira ideal.

Embora não seja exclusiva da culinária do Ceará, a tripa de porco encontra na forma de preparo e no contexto em que é consumida uma identidade bastante nossa. É bastante presente em feiras livres, botecos nos bairros, eventos populares, estádios de futebol e até em algumas barracas de praia, consumida como petisco.

Para Bruno, “é uma iguaria que atravessa gerações, simbolizando o encontro entre a cultura e o convívio diário. No fim das contas, ela é o intestino do animal, e precisa ser devidamente higienizada para ser preparada. O segredo para uma boa tripa está na limpeza minuciosa – virar, lavar, passar limão ou vinagre – e no cozimento adequado, que geralmente envolve uma primeira fervura para garantir maciez e segurança do alimento”.

Temperos simples, a exemplo de alho, sal, pimenta, colorau e limão, realçam o sabor – e ela pode ser  frita ou levada na brasa até alcançar a textura crocante por fora e macia por dentro. O equilíbrio entre textura, sabor e aroma é o que define uma boa tripa como prato gastronômico. Nesse contexto, cabe destacar a importância dos miúdos em nossa mesa.

 

Na imagem, panelada servida no Chico 60 - O Rei da Tripa, localizado no bairro Conjunto Esperança, em Fortaleza
Legenda: Partes miúdas de animais, como os encontrados na panelada, possuem papel fundamental por razões históricas e culturais, aponta estudioso
Foto: Thiago Gadelha

 

“Eles possuem papel fundamental por razões históricas e culturais. Além do aproveitamento integral dos animais, o uso está vinculado à criatividade na cozinha e desenvolvimento de técnicas específicas para esse preparo, bem como à valorização do ingrediente. Pratos com miúdos, como sarapatel, sarrabulho, buchada e panelada e a própria tripa de porco “torrada”, são carregados de sustância, afetividade e memórias”.

Tal qual o Chico 60 – O Rei da Tripa: fazem sucesso porque são saborosos, acessíveis e representam um saber culinário ancestral transmitido entre gerações, com forte ligação à identidade alimentar, cultura e identidade do cearense. Em suma, coisa boa e muito nossa. Ainda bem.

 

Serviço
Chico 60 – O Rei da Tripa
Localizado na Avenida B, 370, apt 201, Conjunto Esperança. Funcionamento: de segunda a quinta, de 17h às 22h; sextas, de 11h às 14h e de 17h às 22h; aos sábados, de 7h às 22h; aos domingos, de 7h às 15h. Mais informações pelas redes sociais do restaurante

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Carlos Alberto

Oi, eu sou o Carlos Alberto, radialista de Campos Sales-CE e apaixonado por futebol. Tenho qualidades, tenho defeitos (como todo mundo), mas no fim das contas, só quero viver, trabalhar, amar e o resto a gente inventa!

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