Quatro órgãos de saúde receberam fiscalização presencial e, em todos os eles, foi detectado que a ocupação dos cargos é feita exclusivamente de forma temporária ou comissionada

O Tribunal de Contas do Ceará (TCE Ceará) identificou irregularidades nas contratações de Consórcios de Saúde do Ceará. O “excesso”, conforme descrito pelo Tribunal, está na quantidade de empregos temporários nestes órgãos: dos quatro consórcios fiscalizados, nenhum tinha ocupado as vagas efetivas previstas. Todos funcionam apenas com empregados temporários ou comissionados.
Além disso, em alguns casos, os contratos temporários excedem o tempo máximo previsto no próprio Estatuto do órgão — neles, o prazo seria de 12 meses, com possibilidade de prorrogação por igual período. Apesar disso, foram identificados contratos temporários com mais de uma década de duração.
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Foram ainda apontados outros problemas, como a falta de critérios para a nomeação dos cargos de direção vinculados aos consórcios — que são responsáveis pela gestão de policlínicas e de Centros de Especialidade Odontológica — e o acúmulo de vínculos empregatícios de funcionários dos órgãos.
A Corte de Contas realizou um levantamento sobre os órgãos de saúde a partir de dados do exercício financeiro de 2024. Foram escolhidos quatro Consórcios de Saúde do Ceará para o aprofundamento dessa análise, com fiscalização presencial e envio de questionários detalhados sobre o funcionamento.
Foram eles, os consórcios da Microrregião de Crato; da Microrregião de Quixadá; da Microrregião de Sobral; e o Interfederativo do Vale do Curu (Cisvale). Os resultados foram divulgados em julho de 2025, após recomendações e relatório final serem aprovados pelos conselheiros do TCE Ceará.
O PontoPoder destrincha quais os principais achados da fiscalização do TCE Ceará em Consórcios de Saúde do Ceará, passando por contratações, desafios dos consórcios com os recursos públicos e os próximos passos projetados pela Corte para o acompanhamento das ações destes órgãos.
Diretor de Fiscalização de Atos de Gestão I do TCE Ceará, área responsável pelo levantamento realizado nos Consórcios de Saúde, Cristiano Goes pontua que o Tribunal nunca havia realizado “uma fiscalização mais ampla” nestes órgãos de saúde. “Tinham tido algumas fiscalizações esporádicas em alguns consórcios e análise nas prestações de conta”, lembra.
Uma delas, inclusive, foi feita em 2019. O TCE Ceará havia determinado auditorias em três consórcios: Camocim, Iguatu e Vale do Curu. Na época, havia um embate político envolvendo estes órgãos, inclusive com forte atuação do então secretário de Saúde do Governo Camilo Santana (PT), Dr. Cabeto.
Ainda assim, o Consórcio de Saúde da Microrregião de Camocim foi o único de fato auditado, ainda em 2019. Por conta da pandemia de Covid-19, a fiscalização nos outros dois foi, inicialmente, adiada para 2021. Com a continuidade da crise sanitária, acabou sendo suspensa.
“Nunca tínhamos tido uma fiscalização mais ampla para entender, avaliar, conhecer de perto os consórcios. (…) Como tem um setor que envolve praticamente todo o estado do Ceará, todos os municípios cearenses, mereceria a gente fazer uma fiscalização mais apurada. Por isso, que foi escolhido o levantamento, para que os técnicos pudessem levantar o máximo possível (de informações), fazer uma grande avaliação dos consórcios públicos de saúde e não simplesmente ir a determinados pontos”.
Goes destaca que houve a compreensão de que a gestão de equipamentos de Saúde por Consórcios de Saúde — que reúne municípios e o Governo do Ceará, por meio da Secretaria de Saúde — é “exitosa” no Estado. “É um serviço realmente muito efetivo, muito bom, que precisa ser aprimorado”, afirma Goes, que reforça que a fiscalização do TCE Ceará busca justamente contribuir com a melhoria dos órgãos.
‘Excesso’ de contratos temporários
Uma série de problemas foi apontada pelo TCE Ceará no que se refere aos cargos e contratações nos Consórcios de Saúde fiscalizados. Existem três irregularidades elencadas:
- A previsão dos cargos no Estatuto do Consórcio, e não no Protocolo de intenções;
- A quantidade excessiva de cargos temporários;
- E a longa duração desses contratos temporários, acima do prazo permitido.
O primeiro problema citado é um descumprimento da Lei 11.107/2005, que estabelece as normas gerais de contratação de consórcios públicos. A legislação federal determina que “o número, as formas de provimento e a remuneração dos empregados públicos, bem como os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público” devem ser descritas no Protocolo de Intenções dos consórcios.
No entanto, no caso dos consórcios do Vale do Curu e de Sobral, essa previsão é feita pelo Estatuto, “o que caracteriza evidência de irregularidade, (…) por existir instrumento não habilitado a conter a previsão”, aponta o relatório do TCE Ceará.
O excesso de empregados temporários e a completa ausência de funcionários efetivos são os principais problemas encontrados no que concerne às contratações. Segundo o TCE Ceará, baseado na legislação federal, a “regra” para o ingresso de empregados “permanece sendo via concurso público”, o que não se efetiva nos consórcios.
- O consórcio da Microrregião do Crato possui 300 funcionários, todos temporários. Por outro lado, existem 139 vagas efetivas ociosas.
- No caso do órgão da Microrregião de Quixadá, existem 109 contratados, sendo 5 comissionados e 104 temporários, apesar de serem previstos 7 cargos comissionados e 146 vagas efetivas.
- O consórcio de Sobral deveria ter 7 cargos em comissão e 103 cargos efetivos. Contudo, apresenta uma equipe com 141 temporários — uma “quantidade desarrazoada”, segundo o TCE Ceará.
- No caso do Cisvale, deveriam haver 8 comissionados e 97 efetivos. Contudo, são 163 contratados — 6 comissionados e 157 temporários.
O levantamento do TCE Ceará acaba por identificar, portanto, um duplo problema: além do excesso de cargos temporários, existe uma contratação de funcionários acima do previsto pelo regramento dos próprios consórcios.
A isso, vem se somar mais uma irregularidade: o descumprimento do prazo máximo permitido para a duração das contratações temporárias. Apenas no Consórcio de Quixadá não foi encontrado esse problema.
Nos órgãos do Crato, de Sobral e do Vale do Curu, foram identificados funcionários que ocupam cargos de forma temporária por mais de 2 anos — que é o prazo máximo permitido segundo as regras dos próprios consórcios, estabelecidas em Estatuto próprio.
Nos casos de Sobral e do Vale do Curu, a duração de alguns contratos temporários superam uma década. No CisVale, existem 91 empregados que foram escolhidos em seleção pública realizada em 2012, e seguem como temporários no órgão.
“O que afronta previsão do próprio Estatuto, pois descaracteriza a contratação emergencial e de excepcional interesse público, e caracteriza contratação permanente, a qual deveria ser regra, mas por concurso público”, diz o relatório do TCE Ceará.
No caso de Sobral, existem contrários temporários que completaram 15 anos em 2025, já que datam de 2010 — o relatório do Tribunal não especificou quantos estão nessa situação.
O que dizem os consórcios?
O PontoPoder acionou os quatro consórcios de Saúde fiscalizados pelo TCE Ceará sobre o excesso de contratações temporárias e também a duração destes contratos, descumprindo regras estabelecidas nos próprios estatutos dos órgãos.
Consórcio da Microrregião do Crato
O Consórcio da Microrregião do Crato informou que “estuda a medida de realização de concurso público”. “Discussão essa que já vem sendo debatida com o Estado do Ceará (ente majoritário do consórcio), Ministério Público e consórcios”, disse.
O órgão ressaltou “é o único consórcio do Estado a possuir duas policlínicas e um CER (Centro Especializado em Reabilitação) IV, além do transporte de pacientes eletivos – 11 micro-ônibus e um CEO Regional”. Sobre o descumprimento da duração de contratos temporários, informou apenas que “tramita, no Poder Judiciário, ação civil pública para provimento dos empregos públicos mediante concurso”.
Consórcio da Microrregião de Quixadá
O Consórcio da Microrregião de Quixadá informou que, até o momento, “não recebeu, de forma oficial, o relatório ou qualquer documento formal do TCE-CE contendo a metodologia, as bases de cálculo, as fontes de dados e as análises utilizadas para a elaboração dos percentuais apresentados”.
“Diante disso, consideramos prematuro emitir posicionamento conclusivo sobre o conteúdo, já que qualquer manifestação sem uma análise criteriosa poderia levar a interpretações equivocadas”, continua a nota.
O PontoPoder questionou ao TCE Ceará se houve o encaminhamento do relatório e demais documentos aos consórcios, mas não recebeu resposta. Todo o processo pode ser encontrado de forma pública no site do próprio Tribunal, conforme acessado inclusive para a produção desta reportagem.
Sobre as contratações temporárias, o Consórcio afirmou que “a estrutura atual tem permitido a continuidade dos serviços com qualidade, mesmo diante dos desafios”. “Atualmente, o quadro funcional está dimensionado conforme a realidade operacional e os desafios encontrados para a contratação de profissionais especializados na região do Sertão Central do Ceará, especialmente em áreas sensíveis da atenção à saúde”, continua o texto.
Sobre a realização de concursos públicos, o Consórcio informou que o tema está sendo debatido com a Secretária de Saúde do Estado e o Centro de Apoio Operacional da Saúde (CAOSAUDE) do Ministério Público do Estado do Ceará, “com vistas à adoção de uma solução que atenda às exigências legais, preserve a continuidade dos serviços e considere as especificidades regionais”.
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Consórcio da Microrregião de Sobral
O Consórcio da Microrregião de Sobral informou que os cargos estão “devidamente previstos nos estatutos e regimentos internos vigentes” e que existe um Grupo de Trabalho (GT) instituído pela Sesa e um do MPCE para discutir “o organograma dos consórcios públicos e as especificidades de cada micro e macrorregião de saúde”.
Quanto ao número de contratações temporárias, o consórcio informou que a “a forma de admissão vigente até o presente momento ocorre mediante processo seletivo temporário, respeitando rigorosamente os princípios da transparência e impessoalidade”.
O órgão reforçou que há uma discussão sobre a realização de concurso público em GT que reúne o Ministério Público, a Sesa e os consórcios, mas que, enquanto não ocorre o certame, existe “previsão estatutária” para a “contratação temporária, excepcionalmente para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”.
“O setor de Recursos Humanos mantém rigoroso acompanhamento da vigência contratual dos empregados públicos, deflagrando novos processos seletivos com a antecedência necessária para garantir a continuidade dos serviços assistenciais prestados à população, evitando qualquer descontinuidade no atendimento nas unidades de saúde gerenciadas pelo Consórcio”, acrescentou sobre a duração das contratações temporárias.
O consórcio ressaltou ainda que o próprio TCE Ceará “comprovou a importância estratégica do modelo consorcial para o Estado do Ceará” e que os consórcios têm impactado “diretamente e de forma positiva na assistência prestada aos munícipes usuários do Sistema Único de Saúde”.
Consórcio da Microrregião do Vale do Curu
O CisVale se posicionou por meio de nota assinada pelo diretor executivo do órgão, Fernando Henrique Goersh Bastos. No texto, o Consórcio afirma que “a atual configuração do quadro de pessoal decorre da necessidade de garantir a continuidade dos serviços de saúde à população”.
O órgão alega que, “enquanto associação pública com personalidade jurídica de direito público e natureza autárquica interfederativa”, possui “autonomia administrativa, patrimonial e financeira, cabendo à Assembleia Geral, instância máxima de deliberação, decidir sobre alterações estruturais e operacionais, inclusive quanto à composição do quadro de pessoal”.
Ao fim, reconhece a importância de “alinhar essa configuração” ao que estabelece a legislação — que coloca o uso de temporários como algo excepcional — e diz que “estão em andamento estudos técnicos para atualização do Protocolo de Intenções e do Estatuto”, mas não há nenhuma informação sobre quando isso deve acontecer.
Já sobre o tempo de contratação, o Cisvale disse que está “revisando os procedimentos internos de contratação e renovação para evitar prorrogações que ultrapassem o prazo de dois anos, com a implementação de controles administrativos mais rigorosos”.
“Já está em andamento um Grupo de Trabalho (GT) conjunto com o Ministério Público, com o objetivo de adotar soluções que atendam aos mandamentos jurídicos sem que ocorra a interrupção da prestação dos serviços de saúde, que também é uma garantia constitucional. O objetivo é, gradualmente, substituir contratos temporários por vínculos efetivos, mediante concurso público”, diz.
E, por último, sobre a irregularidade de prever cargos no Estatuto, quando o correto seria no Protocolo de Intenções, o Cisvale informou que está “promovendo adequações nos instrumentos normativos do Consórcio, de forma a corrigir a inconformidade”.
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O que diz o Governo do Ceará?
Por ser um dos entes a integrar os consórcios de saúde, o PontoPoder indagou ao Governo do Ceará, por meio da Secretaria de Saúde (Sesa), a respeito do problema envolvendo as contratações temporárias, se há alguma fiscalização ou perspectiva de ação para tentar resolver o problema.
A Sesa informou que os consórcios “pela natureza interfederativa, possuem autonomia administrativa e financeira na condução de suas gestões, inclusive para definição do modelo de seu quadro de pessoal”.
“Sendo as decisões tomadas nas respectivas Assembleias Consorciais, a partir do alinhamento de todos os entes pactuantes, não só do Estado. Está em andamento um grupo de trabalho com a participação do Ministério Público e dos consórcios, com o objetivo de analisar a questão e propor encaminhamentos”, finaliza a nota.
Ausência de critérios para nomeação de diretores
Uma das motivações para os embates políticos em torno dos Consórcios de Saúde foi a intensificação das disputas para definição do comando destes consórcios. Na época, em 2019, o presidente era responsável justamente pela indicação de cargos diretivos, com salários de cerca de R$ 10 mil. A forma como eram feitas essas indicações para cargos comissionados, o que incluía as vagas para direção, era um dos pontos contestados nos embates.
No bojo das discussões, um decreto de 2019, editado pelo Governo do Ceará, pretendia descrever os requisitos que deveriam ser atendidos por quem fosse indicado para os cargos. No decreto é descrito que o indicado precisa ter “reputação ilibada e de notório conhecimento” e é descrita a qualificação exigida para cargo, como graduação em curso superior e experiência mínima na área do cargo.
O relatório do TCE Ceará cita que existem controvérsias jurídicas quanto ao decreto estadual, contudo “até onde pôde-se compreender, não houve revogação” do texto e, portanto, as regras estabelecidas devem ser observadas “em fiscalizações de conformidade”.
O Tribunal elenca a forma de indicação de cada um dos consórcios fiscalizados e pontua problemas nessas nomeações. O primeiro deles é no Consórcio de Sobral, cuja seleção de diretores ocorre por “livre escolha do presidente, por se tratarem de cargos de livre nomeação e exoneração”, conforme resposta enviada pelo órgão ao TCE Ceará.
“Há evidência de que existem normativos consolidando as exigências necessárias para seleção de diretores, não sendo, portanto, de livre escolha, como indica o Consórcio de Sobral”, rebate a Corte de Contas no relatório, que acrescenta que o consórcio não “apresentou a qualificação” dos nomeados para a direção.
Além disso, no documento, o Tribunal também destacou que o Consórcio do Crato “não trouxe a experiência dos diretores”. “O que indica precariedade em nomeações sem os requisitos mínimos exigidos”, alerta o TCE Ceará. Em resposta ao PontoPoder, o Consórcio do Crato rebateu a conclusão do Tribunal.
“Todos os empregados públicos em cargos de direção foram devidamente aprovados em processo seletivo realizado pelo estado do Ceará/Secretaria Estadual da Saúde através da escola de saúde pública – ESP e devidamente nomeados pelo CPSMC em assembleia geral, portanto, cumprimos integralmente o que determinou o decreto 33.413/2019”, informou em nota.
O Consórcio de Sobral informou que optou, “após análise jurídica criteriosa, optou por seguir as regras próprias, de forma legal e constitucional, garantindo a segurança jurídica às suas decisões”.
“Ressaltamos que tanto o secretário executivo à época (2024) quanto a atual gestora são profissionais com reconhecida expertise técnica, amplo conhecimento em saúde pública, com formação em sanitarismo e décadas de contribuição ao sistema de saúde do Estado do Ceará”, acrescenta.
Conflitos de interesses
São citados ainda problemas pontuais encontrados nos consórcios de saúde quanto ao quadro de funcionários dos órgãos. O primeiro deles é a contratação de empresas, pelo consórcio, em que o sócio da empresa é empregado do próprio órgão.
Segundo a descrição, um dos empregados do Consórcio da Microrregião do Crato é sócio-administrador de empresa contratada para prestação de serviços de exames de ressonância e ultrassom obstétrico, o que configura conflito de interesse.
O Consórcio informou que “o contrato firmado teve origem em processo licitatório, na modalidade Pregão Eletrônico, no qual apenas essa empresa apresentou interesse no item por ela arrematado”. A empresa, ainda segundo o órgão, realiza exames de ressonância magnética pelo valor unitário de R$ 268,75, conforme tabela SigTap. “Ressalta-se que a adoção dessa tabela pelo Consórcio Público de Saúde da Microrregião de Crato atende à orientação emanada pelo Tribunal de Contas do Estado”, finaliza a nota.
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Também foram identificados empregados com acúmulo de funções, que acontece quando um funcionário tem mais do que três vínculos empregatícios com órgãos públicos.
“O art. 37, da Constituição de 88, permite a acumulação remunerada de dois cargos públicos, quando não há incompatibilidade de horários, a empregos privativos dos profissionais da saúde assim como aos dos professores”, cita o relatório do TCE Ceará.
Os consórcios de Crato, Quixadá e Vale do Curu possuem, juntos, cinco empregados contratados que acumulam três ou mais vínculos empregatícios. “Para citar como exemplo, médico contratado pelo Consórcio de Caucaia e de Quixadá, possui seis vínculos”, pontua o Tribunal. Não são especificados quantos vínculos nem quantos empregados em cada um dos consórcios foram identificados durante o levantamento.
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O Consórcio da Microrregião do Crato informou que os “dois empregados públicos citados no relatório pediram demissão ainda em 2024”. O consórcio ressaltou ainda que os funcionários eram um neurologista infantil e terapeuta ocupacional, “área muito carente e sensível na região”.
O CisVale afirmou que “já vem implementando mecanismos para coibir o acúmulo de cargos, inclusive com exigência de declaração assinada de próprio punho pelo servidor a ser contratado”.
Além disso, informou que realizou auditoria interna para identificar eventuais irregularidades que, caso confirmadas, serão informadas aos funcionários para que estes optem pelos vínculos empregatícios legalmente autorizados. “Essa iniciativa tem caráter preventivo e demonstra nosso compromisso com a conformidade legal”, ressalta a nota.
O Consórcio da Microrregião de Quixadá reforçou que não ter recebido, oficialmente, o levantamento do TCE Ceará, “sendo necessária análise técnica antes de qualquer posicionamento”.
A nota acrescenta que o órgão segue “rigorosamente” o regramento do Ministério da Saúde que veda mais de dois vínculos públicos e que envia mensalmente para a Sesa as “atualizações de inclusão e exclusão de profissionais”. Na nota, o consórcio ressalta que existe uma realidade “de escassez de médicos especialistas no mercado, especialmente em regiões mais distantes dos grandes centros”.
“Nosso compromisso é manter a oferta de atendimento a uma população tão carente como a do Sertão Central, conciliando as exigências legais com a necessidade de garantir o direito de acesso aos serviços públicos de saúde”, finaliza a resposta.
Atuação do Ministério Público do Ceará
O Grupo de Trabalho dos consórcios públicos de saúde do Ministério Público do Ceará (MPCE) foi citado tanto por representantes dos órgãos públicos como pela Secretaria de Saúde do Ceará quando indagados se há uma previsão para a regularização das contratações — com a substituição de temporários por funcionários efetivos, por meio de concurso público.
O motivo disso, explica a promotora de Justiça Karine Leopércio, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Saúde (Caosaúde) do MPCE, é que o regime de pessoal dos consórcios públicos foi uma das prioridades elegidas pelo GT — iniciativa liderada pelo Caosaúde e pelo Centro de Apoio Operacional da Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa (CAODPP).
O grupo iniciou as atividades ainda em 2024, sendo exclusivo para promotores de Justiça, com a meta de estudar a parte documental dos 21 consórcios de saúde do Ceará, assim como os equipamentos vinculados a eles. Na época, o trabalho resultou em um Plano Operacional para otimizar a atuação dos promotores na temática.
Em 2025, o GT foi ampliado e passou a incluir os representantes dos consórcios de saúde e a Secretaria de Saúde do Ceará. “Entendendo a importância do consórcio como instrumento de regionalização dos serviços de saúde. Só que a gente viu que tem alguns pontos que ainda estão bem defasados”, explica a promotora de Justiça.
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Um deles, é o regime de pessoal, “porque a grande maioria dos recursos humanos não é provida mediante concurso”. “E a gente entende que isso é uma ilegalidade que precisa ser combatida”, ressalta. Também foram elencadas como prioridade a transparência, a ausência de indicadores para a qualidade de serviço e o absenteísmo (o não comparecimento do paciente ao serviço).
Foi realizada uma primeira rodada de reuniões com os representantes dos consórcios para informar a respeito destas prioridades e da necessidade de fazer adequações, encontrando soluções ou caminhos para resolver os problemas.
Karine Leopércio diz que, na ocasião, ao citar a quantidade de contratos temporários, o principal argumento dos consórcios era de que estes órgãos “não eram uma política perene” e, portanto, havia o risco de, se houvesse o fim dos consórcios, não ter onde alocar os cargos efetivos.
“Mas só que a gente entende que é uma política perene, sim, porque já está (funcionando) ao longo mais de 10 anos. E cada vez mais os consórcios são utilizados como instrumento da regionalização, que é um dos eixos do SUS, de aproximar o serviço de saúde do cidadão”, rebate a promotora.
Ela afirma, inclusive, que o Governo do Ceará, por meio da Secretaria da Saúde, deve ter papel central na resolução desse problema, já que “além de coordenar essa política de saúde, ele também é o único ente que faz parte de todos consórcios”.
“Então, ele tem um poder, um alcance extremamente grande em todos os consórcios e os consórcios, muitas vezes, ficam aguardando o a diretriz vinda do Governo do Estado, vinda da Secretaria de Saúde”.
A promotora explica que devem ser realizadas novas reuniões em novembro, quando consórcios e Governo do Ceará devem apresentar qual a proposta para resolver o problema dos temporários. “Se eles vão criar lei, como é que vão fazer para sanar esse problema, porque já não dá para continuar”, ressalta, acrescentando as consequências trabalhistas e previdenciárias trazidas pelo imbróglio.
A atuação do Ministério Público do Ceará, que se soma a do TCE Ceará, pode encaminhar uma solução para o problema das contratações temporárias — que descumprem o previsto na legislação — como forma de padronizar o modelo adotado em todos os consórcios de saúde do Ceará.
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