Apostas online são preocupação de áreas técnicas devido ao possível sofrimento mental e comprometimento da renda familiar

A expansão de empresas especializadas em apostas online, mais conhecidas como “bets”, no Brasil, tem preocupado setores da saúde pública diante do aumento de relatos de problemas como depressão, conflitos familiares e até suicídio. Nesse quadro complexo, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, defende que as próprias bets forneçam aos usuários orientação sobre políticas de saúde mental.
Em entrevista ao programa Bom Dia Nordeste, da Verdinha FM 92.5, Padilha falou sobre a preocupação com a ludopatia. O ministro esteve no Ceará para divulgar novas ações para ampliar o acesso da população da capital e do interior a consultas, exames e cirurgias no Sistema Único de Saúde (SUS).
Em resposta a um questionamento sobre planos e diretrizes pensadas no Ministério para a saúde mental no país, o gestor enfatizou que as apostas são uma preocupação importante na área.
“Temos novos desafios: estou nesse momento fazendo uma luta sobre a ludopatia, o vício em jogos eletrônicos. Tem pais e mães de família perdendo até 80% do salário nisso. Pra mim, é igual à luta contra o tabaco”, destaca.
Padilha lembra que ajudou a criar a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) quando foi ministro pela primeira vez, em 2011, destinada ao acolhimento e o cuidado de pessoas em sofrimento mental, “mas de lá pra cá esse problema se agravou muito”, principalmente no pós-pandemia da Covid-19.
Uma pesquisa do Instituto DataSenado feita em 2024 projetou que 13% dos brasileiros com 16 anos ou mais (cerca de 22 milhões de pessoas) haviam participado de apostas nos 30 dias anteriores ao levantamento.
Além disso, de acordo com o estudo “Panorama Político 2024: apostas esportivas, golpes digitais e endividamento”, mais da metade dos apostadores (52%) recebe até dois salários-mínimos por mês (R$3.036).
Para o ministro, as próprias bets precisam dar uma contribuição em relação ao problema, direcionando os jogadores a serviços especializados de saúde através de recados nas próprias plataformas.
“Defendo que as plataformas identifiquem um comportamento compulsivo e mandem mensagem oferecendo contato, telessaúde, para orientar e acolher essa pessoa”, pensa, ressaltando que as empresas possuem dados como identidade e frequência de uso dos jogadores.

Além disso, Padilha defende um novo protocolo de formação dos profissionais de saúde, sobretudo nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS),para enfrentar esse novo problema de saúde mental “avassalador”.
A equipe técnica do Ministério está “estudando” como outros países estão lidando com o tema, mas o ministro ressalta que “o Brasil precisa ser inovador”.
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Novo comando na área
A discussão deve ser capitaneada pelo Departamento de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas (Desmad) do Ministério da Saúde, que em junho ganhou um novo diretor: o médico psiquiatra Marcelo Kimati, professor de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Paraná (UFPR) com vasta experiência na área.
O Desmad tem como competência formular, coordenar, implementar, acompanhar e monitorar a política nacional de saúde mental, álcool e outras drogas, bem como dialogar com a sociedade brasileira para promover avanços nesta política.
Na última semana, Kimati já declarou que a pasta debate a “construção de ações de qualificação da RAPS para o cuidado de pessoas que desenvolvam problemas relacionados a jogos digitais”, orientadas pelo “cuidado centrado na pessoa”, Redução de Danos, informação e fortalecimento da atenção psicossocial.
Como está a regulamentação?
A nível nacional, o Ministério da Fazenda recebeu a competência de regular o setor de apostas de quota fixa desde a sanção da Lei 14.790/2023. No ano passado, foi criada a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) para fazer o setor atuar de forma controlada.
Por meio de uma série de portarias, foram estabelecidas as regras relacionadas à segurança para empresas de apostas e jogadores.
Entre os principais pontos, estão:
- jogadores devem ser identificados por documentos e sistema de reconhecimento facial com prova de vida;
- apostadores devem cadastrar uma conta bancária ou de pagamento em seu nome;
- as empresas de apostas são proibidas de receber depósitos originários de contas bancárias que não sejam cadastradas;
- prevenção de acesso não autorizado, proteção contra hackers e localização segura de servidores;
- a utilização de plataformas de jogos de apostas por crianças e adolescentes é proibida;
- proibição explícita de apostas em eventos esportivos que envolvam categorias de base ou que tenham a participação exclusiva de menores de 18 anos de idade.
A regulação do setor também estabeleceu que as casas de apostas autorizadas só poderão operar com instituições financeiras ou de pagamentos autorizadas pelo Banco Central.
Quanto à saúde, o texto da lei só menciona que pessoas diagnosticadas com ludopatia, por laudo de profissional de saúde mental habilitado, são vedadas de participar dos jogos como apostadores.
Além disso, destina apenas 1% da arrecadação de impostos para o Ministério da Saúde, “para medidas de prevenção, controle e mitigação de danos sociais advindos da prática de jogos”. Em comparação, o Ministério do Turismo fica com 22,4% e, o do Esporte, com 22,2%.
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