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Idosas cearenses são usadas como ‘laranjas’ por associação investigada por fraudes do INSS

A fraude em benefícios de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) não vitimou apenas os que tiveram descontos indevidos em seus ganhos. Aposentadas cearenses foram utilizadas como laranjas por uma das associações investigadas. 

Associação falsificou documentos para inserir aposentadas na diretoria, segundo ações da Defensoria Pública do Ceará

Escrito por
Mariana Lemosmariana.lemos@svm.com.br
09 de Setembro de 2025 – 15:00

imagem mostra fachada do inss em fortaleza
Legenda: Fraude do INSS vitimou idosas no Ceará que foram usadas como laranja por associação investigada por esquemas
Foto: Ismael Soares

fraude em benefícios de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) não vitimou apenas os que tiveram descontos indevidos em seus ganhos. Aposentadas cearenses foram utilizadas como laranjas por uma das associações investigadas.

As vítimas apareciam como membros da diretoria da Associação dos Aposentados e Pensionistas Nacional (Aapen), uma das entidades investigadas por fazer descontos associativos em benefícios do INSS sem autorização.

Seis mulheres foram eleitas membros da diretoria da Aapen em 15 de dezembro de 2023, nos cargos de presidente, vice-presidente, secretárias e conselheiras. Pelo menos duas delas alegam que nunca geriram a associação, conforme ações da Defensoria Pública do Ceará obtidas pelo Diário do Nordeste.

A reportagem optou por não publicar os nomes das idosas envolvidas nas ações. Em nota, a Defensoria informou que ingressou com ação para anular a inclusão do nome de uma idosa de 72 anos, analfabeta e em situação de vulnerabilidade, como presidente de uma associação apontada em esquema de fraudes contra aposentados e pensionistas.

“A mulher acreditava ter assinado documentos para contratar empréstimos consignados, mas acabou registrada como dirigente da entidade, que responde a processos em vários estados por descontos ilegais em benefícios previdenciários.  Na ação, que será apreciada pela Justiça, a Defensoria solicita a imediata exclusão do nome da assistida do quadro diretivo e o fim de sua responsabilização por dívidas e obrigações da associação”, afirmou a Defensoria.

A ata da reunião e o estatuto da associação foram assinados pelas mulheres, com reconhecimento de firma em cartório, mas a defensoria aponta indícios de falsificação nos documentos.

Uma das vítimas não reconheceu a sua assinatura. Outro indício é que as firmas foram reconhecidas no cartório Morais Correia, em Mombaça, no interior do Ceará, enquanto todas as mulheres moram na Região Metropolitana de Fortaleza.

“Seria necessário que todas essas pessoas se deslocassem por quase 300 km para realizar o reconhecimento das assinaturas, quando poderiam ter realizado tal ato no cartório de sua própria cidade de residência”, aponta a defensoria na ação.

 

As vítimas afirmam que só descobriram que tinham integrado a associação em 2025, quando começaram a receber intimações e documentos judiciais em que constavam como réus.

 

Isso porque, com a exposição da fraude dos descontos indevidos, aposentados e pensionistas começaram a processar as associações que realizavam os débitos. Os descontos indevidos começaram a ocorrer em 2019, mas só foram revelados em abril de 2025, em operação da Polícia Federal.

Nos processos movidos pelos beneficiários contra a Associação dos Aposentados e Pensionistas Nacional (Aapen), essas mulheres são enquadradas como réus.

A reportagem também solicitou à Defensoria um advogado que estive à frente dos casos das idosas, mas o órgão informou que não está concedendo entrevistas sobre as ações. O espaço segue aberto para manifestação.

IDOSA FOI CAPTADA PARA EMPRÉSTIMO E SE TORNOU ‘PRESIDENTE’ DA ASSOCIAÇÃO

Uma idosa de 62 anos, moradora do bairro Antônio Bezerra, em Fortaleza, foi eleita como presidenta da associação. Analfabeta, com capacidade apenas de assinar o próprio nome, ela foi enganada pela associação na promessa de que faria um empréstimo de R$ 1.500.

Ela denuncia que, em 2023, foi abordada por Liduína Sousa Mendes, que costumava captar pessoas para realizar empréstimos consignados na região.

“Liduína era quem intermediava o contato entre ela e supostos advogados, os quais alegavam que o referido empréstimo fora disponibilizado pelo Governo Federal”, aponta a ação.

A aposentada foi conduzida por diversos advogados a assinar documentos e chegou até a ir a um cartório, sem saber do que se tratava realmente. Em 2025, ela foi surpreendida com intimações e citações judiciais.

O nome dela consta na lista de réus que tiveram seus bens bloqueados pela Justiça no processo que investiga a fraude do INSS. A Aapen teve o bloqueio de R$ 281 milhões.

Há mais de 200 processos em desfavor da idosa, que afirma que não teve qualquer participação ativa na associação, nem exerceu funções de gestão ou controle.

“É pessoa simples, mora na periferia de Fortaleza, não possui bens, tendo como fonte de renda um benefício previdenciário e, complementando sua renda no préstimo de manicure, quando consegue clientes”, destaca a defensoria.

Diário do Nordeste tentou contato com a Aapen e com Liduína Sousa Mendes, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto.

BLOQUEIO DE CONTAS BANCÁRIAS

Outra vítima da associação é uma aposentada de 70 anos, moradora da Caucaia, que foi ‘eleita’ como primeira conselheira fiscal da Aapen.

A idosa também descobriu a fraude ao receber citações judiciais de processos movidos em Goiás, Bahia e Rio Grande do Norte. Ela afirma desconhecer a associação e nunca ter assinado qualquer documento para assumir cargos de gestão.

A aposentada denuncia diversos prejuízos pelos processos, como bloqueio de contas bancárias e inscrição de seu nome em cadastros de devedores.

“Trata-se de uma situação de extrema injustiça, que submete uma senhora idosa à insegurança constante e ao temor de ver seu nome vinculado a litígios dos quais não possui qualquer relação, configurando inequívoco dano moral e material”, aponta a ação da defensoria.

 

A ação judicial ressalta que a vítima encontra-se em situação de extrema vulnerabilidade, com medo de sofrer consequências legais ou financeiras, integridade abalada e insegurança.

 

FRAUDE DO INSS

A Aapen está entre as dezenas de associações e empresas processadas pela Controladoria-Geral da União por realizar descontos associativos nos benefícios de aposentados e pensionistas.

Estima-se que cerca de R$ 6,3 bilhões foram descontados de aposentados e pensionistas entre 2019 e 2024, sem que eles soubessem que integravam as associações.

As investigações identificaram a utilização de plataformas eletrônicas que simulavam as fichas de filiação, burlando as normas do INSS. Há também indícios de descontos realizados nos benefícios de pessoas já falecidas.

Entre 2019 e fevereiro de 2025, o INSS realizou pagamentos a 275 mil pessoas já falecidas, com prejuízo de R$ 4,4 bilhões.

O governo federal está realizando a devolução dos descontos indevidos a aposentados e pensionistas. O Ministério da Previdência Social estima que mais de 1,9 milhão de pessoas estão aptas a receber os descontos.

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Carlos Alberto

Oi, eu sou o Carlos Alberto, radialista de Campos Sales-CE e apaixonado por futebol. Tenho qualidades, tenho defeitos (como todo mundo), mas no fim das contas, só quero viver, trabalhar, amar e o resto a gente inventa!

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