A Associação Brasileira da Indústria de Pescados (Abipesca) faz alerta sobre o Vírus da Tilápia do Lago, que existe na Ásia e que pode infectar a criação da tilápia brasileira

TiLV (Tilapia Lake Virus, que em português quer dizer Vírus da Tilápia do Lago) é um vírus que infecta tilápias, tanto selvagens quanto de aquicultura. É uma doença grave que pode causar alta mortalidade nos peixes e que se registra mais fortemente na Ásia, onde está o Vietnã, que foi visitado na semana passada pelo presidente Lula.
Nas reuniões com as autoridades do governo vietnamita ligadas à agricultura, ficou encaminhada uma espécie de troca de favores na balança comercial de ambos os países: o Brasil mandará para lá carne de frango e de boi e, em contrapartida, o Vietnã mandará para cá… sua tilápia. Os tilapicultores brasileiros desconfiam de que os vietnamitas querem incluir nesse pacote, também, e este é um desejo antigo, o seu camarão. Que tal?
Voltemos ao dia 13 de dezembro de 2004, quando, sem muito barulho, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) publicou a Portaria DAS/Mapa 1.213, que “submete à consulta pública a Minuta de Análise de Risco de Importação de produtos derivados de tilápias, estabelecendo um canal de participação para diversos setores da sociedade, cadeia de produção e demais partes interessadas”.
Elaborado e assinado pelas suas médicas veterinárias Anniela Banat e Luana Coutinho Cavalcante, a Associação Brasileira da Indústria de Pescados (Abipesca) publicou documento técnico sobre o assunto, como contribuição ao debate do tema. O texto lembra que a Minuta do Mapa “é fruto de uma análise detalhada, desenvolvida de acordo com o Art. 80 do Decreto nº 5.741 de 2006, que instituiu a análise de risco como ferramenta fundamental na definição das medidas necessárias à sanidade agropecuária no país”.
No documento, a Abipesca destaca “as lacunas da abordagem adotada” (na Minuta), e sugere “melhorias para garantir uma avaliação mais robusta e precisa”. E salienta de pronto:
“A análise de risco proposta é de natureza ampla, considerando produtos de tilápia provenientes de qualquer país exportador. Embora essa abordagem genérica busque simplificar a avaliação, ela falha ao desconsiderar as diferenças significativas entre os países produtores.
“A globalização da indústria pesqueira e a diversidade nas práticas sanitárias e de manejo entre os países exportadores exigem uma análise mais específica para garantir a segurança desses alimentos. A introdução de patógenos como o TiLV pode variar consideravelmente, dependendo das condições sanitárias e práticas locais, tornando a análise genérica inadequada para a avaliação precisa dos riscos globais.”
E diz ainda:
“Ademais, a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) estabelece que os riscos sanitários devem ser avaliados com base em critérios específicos, como o status sanitário do país exportador, o controle das práticas de manejo e as condições epidemiológicas prevalentes. Países com sistemas de monitoramento mais rigorosos, como Estados Unidos e Chile, apresentam menor risco de disseminação do TiLV em comparação com países com vigilância insuficiente ou inexistente, que enfrentam surtos recorrentes de TiLV. A alta densidade de cultivos de tilápia e a falta de controles sanitários adequados favorecem a propagação do vírus.
“A pesquisa de Chiu et al. (2017) destaca que o TiLV tem maior probabilidade de sobrevivência e propagação em condições de manejo inadequado, o que é comum em países com infraestrutura de controle sanitário deficiente. Por essa razão, uma análise de risco que leve em conta as especificidades de cada país exportador poderá identificar de forma mais precisa os riscos e permitir a implementação de medidas preventivas mais eficazes.”
Há outros trechos importantes do documento. Por exemplo:
“Outro ponto importante da minuta refere-se à análise de risco que se concentra apenas no risco de introdução da TiLV, sem considerar outros patógenos epidemiológicos de carácter semelhante. A exclusão da avaliação de exposição, fase que avalia outras potenciais ameaças sanitárias, pode abrir espaço para a introdução de doenças exóticas no país, o que representa um risco adicional à aquicultura nacional e à indústria pesqueira. A análise deveria considerar a totalidade dos riscos relacionados à importação de tilápias, adotando uma abordagem mais abrangente elencando patógenos como parvovírus da tilápia, que é emergente na Ásia, entre outros relacionados.”
E mais este:
“(…) A avaliação final de impacto indicou que a introdução e disseminação do TiLV não podem ser negligenciadas. Caso o TiLV seja introduzido no Brasil, as consequências podem ser severas, afetando tanto a sanidade de produção e cultivo nacional, quanto a indústria pesqueira e o comércio internacional.”
Os produtores brasileiros de tilápia, que se concentram em Minas Gerais, no Paraná, na Bahia e em outros estados do Nordeste, como o Ceará, mostram-se preocupados com a possibilidade de o Brasil vir a importar o produto do Vietnã e, com ele, o Vírus da Tilápia do Lago.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, que acompanhou o presidente Lula na visita ao Vietnã, deve estar bem fundamentado para avalizar essa importação. Mas, mesmo assim, os líderes da aquicultura brasileira não escondem sua angústia e ansiedade diante dessa provável concorrência asiática por causa da ameaça fitossanitária. É que quase tudo o que vem da Ásia chega aqui a preço mais baixo do que o custo de produção.
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